quarta-feira, 11 de julho de 2012

Texto: Um apólogo - com interpretação textual

Era uma vez uma agulha, que disse a um novelo de linha:
— Por que está você com esse ar, toda cheia de si, toda enrolada, para fingir que
vale alguma coisa neste mundo?
— Deixe-me, senhora.
— Que a deixe? Que a deixe, por quê? Porque lhe digo que está com um ar
insuportável? Repito que sim, e falarei sempre que me der na cabeça.
— Que cabeça, senhora? A senhora não é alfinete, é agulha. Agulha não tem
cabeça. Que lhe importa o meu ar? Cada qual tem o ar que Deus lhe deu.
Importe-se com a sua vida e deixe a dos outros.
— Mas você é orgulhosa.
— Decerto que sou.
— Mas por quê?
— É boa! Porque coso. Então os vestidos e enfeites de nossa ama, quem é que
os cose, senão eu?
— Você? Esta agora é melhor. Você é que os cose? Você ignora que quem os
cose sou eu, e muito eu?
— Você fura o pano, nada mais; eu é que coso, prendo um pedaço ao outro, dou
feição aos babados...
— Sim, mas que vale isso? Eu é que furo o pano, vou adiante, puxando por você,
que vem atrás, obedecendo ao que eu faço e mando...
— Também os batedores vão adiante do imperador.
— Você é imperador?
— Não digo isso. Mas a verdade é que você faz um papel subalterno, indo
adiante; vai só mostrando o caminho, vai fazendo o trabalho obscuro e ínfimo. Eu
é que prendo, ligo, ajunto...
Estavam nisto,
quando a costureira chegou à casa da baronesa. Não sei se disse que isto se
passava em casa de uma baronesa, que tinha a modista ao pé de si, para não
andar atrás dela. Chegou a costureira, pegou do pano, pegou da agulha, pegou
da linha, enfiou a linha na agulha, e entrou a coser. Uma e outra iam andando
orgulhosas, pelo pano adiante, que era a melhor das sedas, entre os dedos da
costureira, ágeis como os galgos de Diana — para dar a isto uma cor poética. E
dizia a
agulha:
— Então, senhora linha, ainda teima no que dizia há pouco? Não repara que esta
distinta costureira só se importa comigo; eu é que vou aqui entre os dedos dela,
unidinha a eles, furando abaixo e acima.
A linha não respondia nada; ia andando. Buraco aberto pela agulha era logo
enchido por ela, silenciosa e ativa como quem sabe o que faz, e não está para
ouvir palavras loucas. A agulha vendo que ela não lhe dava resposta, calou-se
também, e foi andando. E era tudo silêncio na saleta de costura; não se ouvia
mais que o plic-plic plic-plic da agulha no pano. Caindo o sol, a costureira dobrou
a costura, para o dia seguinte; continuou ainda nesse e no outro, até que no
quarto acabou a obra, e ficou esperando o baile.
Veio a noite do baile, e a baronesa vestiu-se. A costureira, que a ajudou a vestirse,
levava a agulha espetada no corpinho, para dar algum ponto necessário. E
quando compunha o vestido da bela dama, e puxava a um lado ou outro,
arregaçava daqui ou dali, alisando, abotoando, acolchetando, a linha, para mofar
da agulha, perguntou-lhe:
— Ora agora, diga-me quem é que vai ao baile, no corpo da baronesa, fazendo
parte do vestido e da elegância? Quem é que vai dançar com ministros e
diplomatas, enquanto você volta para a caixinha da costureira, antes de ir para o
balaio das mucamas? Vamos, diga lá.
Parece que a agulha não disse nada; mas um alfinete, de cabeça grande e não
menor experiência, murmurou à pobre agulha:
— Anda, aprende, tola. Cansas-te em abrir caminho para ela e ela é que vai gozar
da vida, enquanto aí ficas na caixinha de costura. Faze como eu, que não abro
caminho para ninguém. Onde me espetam, fico.
Contei esta história a um professor de melancolia, que me disse, abanando a
cabeça: — Também eu tenho servido de agulha a muita linha !

Compreensão do texto

1-O que acabamos de ler é um apólogo que é uma narrativa que busca ilustrar
lições de sabedoria ou ética, através do uso de personalidades de índole diversa,
imaginárias ou reais, que podem ser tanto inanimadas como animadas. Quais são
os personagens desta história?

2-O que ocasionou a discussão entre as personagens?

3-No trabalho de coser,quem era mais importante?

4-O que estava sendo costurado?Para quem?

5- Qual foi o conselho do alfinete para a agulha? O que ele quis dizer com isto?

6-Separe o sujeito do predicado.
a) O vestido da baronesa ficou muito bonito.
b) A linha foi ao baile feliz.
c) O buraco foi aberto pela agulha.
d) A agulha ficou na caixinha de costura.

7-Leia as frases e classifique os verbos em negrito
a) Se eu soubesse costurar...
b)Quando ela chegar explicarei tudo
c)Ela costurará para a baronesa.
d) A linha não respondia nada

Um comentário: