Opinar faz a diferença
Corra, Diogo, corra!
Caetano Veloso agora é colunista de O Globo. Desde sua estréia, num domingo, quatro semanas atrás, estou tentando arrumar outra maneira para me sustentar. Se até Caetano Veloso se tornou um colunista, tenho de mudar de trabalho urgentemente. Assim como os cachorros latem antes dos terremotos, eu interpreto os artigos do Caetano Veloso como sinais de alerta para um desastre iminente. Au! Au! O colunismo está ruindo. Au! Au! O colunismo está se esboroando. Au! Au! Émelhor fugir para o meio da rua, antes que o teto desabe sobre mim. Corra, Diogo, corra! Imediatamente depôs de Caetano Veloso estrear como colunista de O Globo, a Folha de S. Paulo passou a contratar colunistas por metro.
No momento, o jornal tem cento-e-vinte-e-oito colunistas. Esse foi o número anunciado por seus próprios editores: cento-e-vinte-e-oito. Nizan Guanaes é um dos novos contratados pela Folha de S. Paulo. No passado, o colunismo era um reduto dos mineiros. Agora ele é dominado pelos baianos. Na semana passada, Lula reclamou da “elite que escreve colunas neste país”, só porque alguns articulistas denunciaram o apoio que ele deu à bomba nuclear iraquiana. Elite? Qual elite? No Brasil, qualquer um pode se tornar colunista. Temos mais colunistas do que metalúrgicos. Lula repudiou a mentalidade colonizada de nossos colunistas, mas o fato é que a mentalidade da maioria deles nunca saiu dos arredores do Pelourinho. Resultado: os cento-e-vinte-e-oito colunistas da Folha de S. Paulo ovacionaram Lula por seu apoio à bomba nuclear iraniana.
Se o Renascimento teve Ticiano, o nosso tempo tem os analistas técnicos das bolsas de valores. O que é que isso tem a ver com o Caetano Veloso? Respondo imediatamente: a fim de me livrar do colunismo, decidi procurar outra fonte de renda, investindo no mercado financeiro. Os analistas técnicos desenham gráficos para tentar antecipar os movimentos das bolsas de valores. Ocasionalmente, esses gráficos assumem formas humanas. Um deles tem o nome de um produto anticaspa: Head and Shoulders. No Head and Shoulders, um índice financiero sobe até determinado paramar, formando o ombro direito; depois sobe outro tanto, delineando uma cabeça: depois ele oscila até o patamar inferior no que seria o ombro esquerdo. Na quarta-feira, analisando uma série de gráficos das bolsas de valores, vislumbrei aquilo que me pareceu ser o contorno do cotovelo direito de um retrato pintado por Ticiano, em 1525. Especificamente: o retrato de Federico II com seu cachorro. Au! Au! Apliquei na hora todas as minhas economias. Se o investimento der certo, nunca mais farei um artigo. Se der errado, terei de me transformar num colunista baiano.
MAINARD, Diogo. Corra, Diogo, corra. In: Revista Veja. Disponível em:
• superstição subst. fem. 1. Crença ou sentimento sem base na razão, e que induz a admitir falsos deveres, recear coisas fantásticas ou absurdas, etc. 2. Crença em presságios tirados de fatos apenas fortuitos (acidental, casual).
• esboroar verbo trans. dir. 1. Reduzir(-se) a pó; desfazer(-se). 2. Desmoronar(-se).
• onomatopéia subst. fem. Palavra que imita o som natural da coisa significada. [Exemplo: tique-taque]
• Ticiano (Tiziano Vecellio) (1485, Itália – 1576). Pintor, grande retratista. Obras: A Vênus de Urbino, Jovem Inglês, Aterino, etc.
• renascimento subst. masc. 1. Ato de renascer, ou o resultado deste ato. 2. Figurado Vida Nova. 3. Artes História Movimento com incício no século XIV, na Itália, prolongando-se até o século SVII, marcado pelo florescimento das artes e da literatura sob a influência da Antiguidade Clássica, e também como início da ciência moderna.
1. Em relação ao texto Corra, Diego, corra!, é possível afirmar que:
( ) trata-se de uma reportagem sobre a quantidade de colunistas na contemporaneidade.
( ) é um artigo de opinião em que o autor expressa suas ideias em relação à contratação de um colunista.
( ) pode ser considerado como uma notícia, pois apresenta um fato (contratação), localizado temporalmente (quatro semanas atrás).
2. Quais são os objetivos desse texto?
3. O autor utiliza como estratégia argumentativa uma superstição popular. Qual é?
4.Que relação o autor estabelece entre a superstição e a contratação de Caetano Veloso como colunista?
5. O autor do texto utiliza uma onomatopéia. Transcreva-a.
6. Analise os fragmentos a seguir e assinale a alternativa correta em relação aos sentidos construídos no texto:
a) “O colunismo está se esboroando”.
( ) O colunismo está se desmantelando, ruindo, se desfazendo.
( ) O colunismo não pode mais ser comparado a outras atividades de escrita.
b) “[...] a Folha de S. Paulo passou a contratar colunistas por metro”.
( ) um dos critérios de contratação de colunistas é a altura que o indivíduo tem.
( ) a expressão “metro” indica que o colunista será contratado a partir do grau de importância que ele tem na sociedade.
7. O que se pode inferir a partir da conclusão do artigo?
( ) Que o autor está desanimado com sua atividade como colunista e deseja realizar outra atividade.
( ) Que ele não quer ganhar dinheiro na bolsa de valores porque prefere escrever.
( ) Que os colunistas atualmente precisam desempenhar várias funções para sobreviver.
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